Separando o joio do trigo

Eu não senti. O Fre não sentiu. O Doo não sentiu. O Felipe não sentiu.

A Quéroul sentiu. A tia Ligia sentiu. A Tia Diná sentiu.

Ovo, você é viado!


Sobrevivendo à faculdade

Em quase seis anos e meio de faculdade (sim, vocês conhecem o ditado -- nice guys finish last), eu finalmente cometi o erro que eu vinha, a todo custo e com muito sucesso, tentando evitar: deixar que aquele professor com quem você não se importa nem um pouco saiba quem você é.

O leitor veterano e malaco pode pular este parágrafo; para o estudante universitário escolado, o que vem agora não é nenhuma novidade. Mas a informação pode auxiliar quem está começando a vida acadêmica e ainda não pensou nisso, ou já pensou mas não tem muita certeza se funciona ou não. Enfim, é essencial que você não seja notado naquela matéria obrigatória mas de pouca importância para o que você planeja, ou naquela aula em que o professor é picareta, ou na maioria das matérias que você faz. Isso te dará mobilidade para cuidar dos seus reais interesses acadêmicos -- você pode matar aula para terminar um trabalho interessante na biblioteca; deixar seu material na sala e ir conversar com aquele professor que pode te orientar numa pesquisa; assinar o nome na lista de presença e ir tomar uma cerveja; voltar pra casa e dormir. Fazendo direitinho, o aluno sai da matéria inútil com 100% de presença e nota acima de 8,0. E, mais importante, com a vida adiantada, já que ele não gastou horas preciosas com matéria inútil. Tudo o que você precisa fazer é não falar, não chegar atrasado, sair discretamente e/ou arranjar alguém pra assinar a lista por você.

Pois bem, o leitor não-ingênuo percebeu como funciona, o leitor ingênuo aprende a lição agora: se tivesse pulado o parágrafo, não teria perdido tempo lendo informação repetida e senso-comum. Se liga, lingüística para a vida: o enunciado que não apresenta informação nova é psicologicamente insuportável.

Enfim, no começo do ano eu não pude conter a minha fúria pseudo-intelectual belicosa contra uma criatura que jurava de pé junto que foi só a partir do modernismo que a poesia deixou de ser sobre o amor, sobre o etéreo, sobre o inatingível. Ora, eu não me agüentei, e mandei ver no vomitório poser name-dropping de toda poesia anterior ao romantismo que não era assim, começando pelos gregos. E é óbvio que não adiantou nada, porque a anta de polainas nem entendeu o que eu estava falando.

Hoje, eu suportei tudo muito dignamente: enquanto rolava um seminário com alguns achismos e um pouco daqueles dados biográficos que a gente usa pra enganar criança quando quer matar um pouco de tempo, eu permaneci em silêncio, cabeça abaixada, cara de concentrado, escrevendo no caderno. (na verdade eu estava desenhando umas caricaturas, mas pra quem vê de fora o efeito é o mesmo, ok?) Quando a aula acabou, eu levantei e me dirigia a porta, quando esbarrei com a professora, que olhou para mim e disse:
- Ah, mas você ficou muito quietinho hoje, você não é assim.

Como assim? Semana passada a aula era no escuro! Assinei a lista e saí correndo. Semana retrasada foi palestra com o Mia Couto, não teve aula oficialmente, ela não me viu. Que memória do caráleo!!!

Conclusão: tomei no cu, fi. Estou obrigado a intervir em todos os seminários, ir às aulas, olhar pra professora e sorrir. O dilema moral é: uso do palavrório-pseudo-humilha-interlocutor, ou das asserções-redundantes-auto-afirmativas (i.e.: Sim, concordo. Aliás, segundo eu ouvi, Aristóteles já morreu, não é verdade, professora?)?

Claro que este é um falso-dilema. A leitora experiente sabe que eu sou incapaz de concordar com o que quer que seja, e havendo discordância, eu piso no calo e bato na orelha.